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Nômades digitais: Novas tribos do mercado de trabalho e desafios da gestão de pessoas

Paula Giannetti (para HSM)


Um novo modelo de trabalho – remoto, com carga horária flexível, automatização e substituição de funções – ganhou força e vem ampliando a discussão sobre as modalidades de vínculo de empregatício.


No artigo “Build, Buy, Borrow or Bot” (Construir, Comprar, Emprestar ou Robotizar), de 2019, a consultoria Accenture apresentou uma reflexão sobre como as mudanças tecnológicas e a contínua “guerra por talentos” tem criado novas oportunidades para a implementação de uma gestão flexível dos recursos humanos, muito mais aderente ao momento atual de transformação que a maioria das empresas tem vivenciado.


Este conceito de força de trabalho adaptativa possibilita a quebra de alguns paradigmas e limitações do processo de “manpower planning” – processo sistemático de planejamento para prever a oferta e demanda futura dos recursos humanos e das competências necessárias para atender a estratégia e objetivos de crescimento do negócio no âmbito local ou global – como o controle do aumento do número de headcount e a garantia da aquisição do know how necessário através de altos investimentos na capacitação interna ou na contratação de novos profissionais “prontos” do mercado, em regime CLT.


Novas formatos de trabalho e contrataçãoPrincipalmente na área de tecnologia, onde se concentram atualmente o maior número de posições para contratação, a modalidade de freelancers e consultores (dentro e fora do próprio país) vem se intensificando e comprovando que o capital intelectual pode estar disponível em qualquer lugar do planeta.


Em outra pesquisa, também de 2019, realizada pela Deloitte, ficou clara uma tendência de migração entre as modalidades de contratos de trabalho não apenas para os profissionais de TI. Modelos de vínculos empregatícios até então menos valorizados pelos profissionais estão aumentando e, aparentemente, atendem melhor aos anseios de independência e autonomia das novas gerações de profissionais que ingressam no mercado de trabalho.


Mas não são somente os jovens https://www.revistahsm.com.br/post/a-angustia-dos-jovens-na-escolha-profissional que veem com bons olhos estas mudanças. Para muitas empresas, as novas tecnologias e os novos modelos de trabalho são uma grande oportunidade, e podem trazer benefícios ao permitir a contratação de profissionais qualificados do mundo inteiro sem os altos custos, burocracia e problemas de adaptação cultural enfrentados nos processos tradicionais de expatriação de profissionais.


De acordo com Mariana Barros, interculturalista e fundadora da Differance Intercultural Consultants, apenas 25% dos processos de expatriação realizados são “bem-sucedidos”. Entre os principais motivos pelos quais os processos de expatriação fracassam estão: as dificuldades com a adaptação intercultural; o profissional expatriado não conseguir responder às responsabilidades assumidas por falta de habilidades técnicas para a tarefa e para gestão de pessoas em um outro país; problemas de ordem familiar: adaptabilidade da família ao novo contexto.


Se a expatriação apresenta tantos desafios para os profissionais e organizações, a combinação de tecnologia e modelos alternativos de trabalho deu espaço para os denominados os nômades digitais. “Um nômade digital é alguém que deseja a liberdade de viver e trabalhar de qualquer lugar do mundo e usa a tecnologia para tornar esse desejo uma realidade”, define Keith, empresário e autor do blog Nomad Flag.


O trabalho de um nômade digital é totalmente online e ocorre em qualquer lugar em que ele esteja, e este novo modelo de atuação vem se definindo como parte de um estilo de vida que tem ganhado cada vez mais adeptos. O nomadismo digital ganhou bastante notoriedade nos últimos anos e se intensificou ainda mais com a pandemia de Covid-19 e a nova realidade do trabalho híbrido. Algumas pesquisas indicam que, até 2025, haverá 1 bilhão de nômades digitais no planeta.


Olhando para o cenário brasileiro, a adoção do modelo de trabalho remoto ganhou escala desde o início da pandemia. De acordo com a Pesquisa de Gestão de Pessoas na Crise Covid-19, elaborada pela Fundação Instituto de


Administração (FIA), 46% das empresas no Brasil adotaram a estratégia de trabalho remoto durante a pandemia. No setor de comércio e serviços, 57,5% dos trabalhadores adotaram o teletrabalho; em pequenas empresas, esse percentual ficou em 52%.


Oportunidades e desafios do “anywhere office”Ter uma carreira internacional e trabalhar em times multiculturais, sempre fez parte das ambições de boa parte dos profissionais, e agora o sonho está muito mais próximo da realidade. Alguns países europeus, mais avançados no quesito acessibilidade e adoção de tecnologia, estão incentivando a realização de negócios em seus países e, consequentemente, aquecendo seus mercados de trabalho internos.


A Estônia, por exemplo, criou, em 2014, um programa que permite que qualquer pessoa abra uma empresa de forma 100% online no país, com um investimento de € 100. Recentemente, o país anunciou a emissão de uma modalidade de visto para “cidadania digital” criando o e-Residency. Na América do Sul, o Brasil é o país com maior número de aplicações ao e-Residency.


A República Tcheca, também criou o “zivno”, uma espécie de visto comercial de longo prazo. O principal objetivo destas novas modalidades de visto é a desburocratização de processos com foco, principalmente, em nômades digitais, empresários e freelancers.


Na esteira das as mudanças, as evoluções tecnológicas são sempre as primeiras em um processo evolutivo e fazem com que os indivíduos adotem novos hábitos e comportamentos. As empresas acompanham estas mudanças, ajustando seu modelo de negócio e processos de contratação para manter a sua competitividade no mercado. No entanto, a revisão ou criação de políticas e leis para orientar e regular todas estas mudanças são sempre as últimas a ocorrer!


E este é um ponto importante no que se refere ao mundo do trabalho pois, embora vários países já tenham criado políticas e vistos de trabalhos exclusivos para esta nova modalidade, os principais pontos de dúvidas e discussões existentes estão relacionados a aspectos das legislações trabalhista e tributária.


Diante de tudo isto, como profissional de RH estou feliz em viver este momento! Principalmente pela oportunidade de discutir e criar políticas e regras que garantam flexibilidade e autonomia para os profissionais, além de segurança para as relações trabalhistas. Essas transformações, hoje aceleradas pela pandemia, estimulam a criatividade e nos levam a experimentar novas ferramentas e processos de “RH” para gerir e engajar pessoas em um contexto de trabalho remoto.


Agora os desafios estão maiores! Como será a remuneração desses profissionais nômades que se deslocam com frequência? Como trabalhar com equipes multiculturais em ambientes exclusivamente digitais? Qual a regra para estabelecer um horário “default” com pessoas em diferentes países e com fusos horários diferenciados? As tabelas salariais vão cair em desuso? Como estimular o funcionário para que ele atenda com sucesso as expectativas e tenha entregas consistentes com um modelo de trabalho 100% virtual? Qual o destino das leis trabalhistas e como adaptá-las na velocidade necessária para atender uma crescente demanda do trabalho sem fronteiras?


O mundo globalizado está derrubando barreiras com a velocidade da luz e nós, que lideramos as práticas de gestão de pessoas, temos um desafio gigantesco de estabelecer novas regras muito mais flexíveis, para nos adaptarmos à essa nova realidade que se impõe. Cuidar do ser humano em sua essência, apostar em suas potencialidades, capacitá-lo e enxergá-lo como um ser livre, que não está mais dentro das quatro paredes de um escritório, é quebrar os paradigmas e apostar no novo que está se apresentando como um futuro que já está logo ali.


Eu quero fazer parte desse novo movimento para atender às necessidades das empresas que dependem dessa mão de obra para prosperar e se reinventar. Se essa inquietude também é sua, estou pronta para uma boa xícara de café (e muitas histórias para contar). Vamos conversar?

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